A bichectomia é um procedimento que consiste na remoção de
parte da gordura de Bichat, estrutura adiposa localizada na face. Quando se
deseja ressaltar os contornos faciais e valorizar o resultado estético,
sobretudo em faces mais arredondadas, podemos lançar mão da técnica. Técnica
aliás que não é nova. Embora eu tenha visto alguns dentistas reivindicarem
pioneirismo, a bichectomia é realizada em vários países desde a década de 80, e
há quase uma década por nós (Dr. Fábio Calandrini e equipe).
Acontece que após reportagens em alguns meios de
comunicação, discorrendo sobre a técnica e as celebridades que se submeteram ao
procedimento, a bichectomia virou febre. Por estar ao alcance do
Cirurgião-Dentista, centenas de profissionais
da noite para o dia começaram a oferecer o procedimento a seus pacientes, e
outros tantos se tornaram professores, em busca de pacientes para utilizar
nos cursos.
Minha prática clínica é voltada para a cirurgia
ortognática, e cirurgia facial estética. Não raro, tenho recebido pacientes que
disseram ter se submetido à bichectomia, mas que se mostraram insatisfeitos.
Boa parte considerou os resultados aquém do esperado. Alguns não notaram
diferença e houve dois casos de pacientes com a face assimétrica após a
bichectomia.
Conversando com os pacientes e com alguns colegas
Cirurgiões-Dentistas que frequentaram algum entre os numerosos cursos de
bichectomia, cheguei a algumas conclusões, sobre o porquê de tantos pacientes
frustrados.
Primeiramente, me parece que alguns cursos falham em ensinar
adequadamente a propedêutica para se indicar o procedimento. Ignoram
considerações sobre noções craniométricas, estrutura óssea e muscular,
avaliação da gordura subcutânea, pele, etc. Dessa forma os profissionais que
saem de muitos desses cursos não estão seguros sobre quando indicar e quando contraindicar
a bichectomia. Por este motivo, falham em esclarecer ao paciente sobre as
limitações de cada caso, criando muitas vezes, expectativas irrealistas. Basta
lembrar que em muitos dos casos de pacientes que procuram pelo procedimento, a
queixa é de “bochechas grandes”. Acontece que esta queixa, deverá ser traduzida
em diagnóstico a partir de uma avaliação clínica adequada. Há casos em que a
queixa do paciente é multifatorial, resultando simultaneamente de características
ósseas, musculares e subcutâneas, cada uma delas em graus variados.
Me parece também que pode haver por parte de alguns
profissionais a falta de conhecimento anatômico adequado sobre a gordura de
Bichat. Essa estrutura possui uma porção pterigóidea e uma outra infratemporal,
que se retiradas, não geram nenhum benefício estético, além de submeter o
paciente a riscos desnecessários. Dependendo de onde se realiza a incisão para
a bichectomia, e de como é feita a dissecção, a porção bucal pode não estar
sendo acessada adequadamente, ou as demais porções podem estar sendo
desnecessariamente removidas. Daí os casos de assimetria pós-operatória.
É importante esclarecer ao paciente que a bichectomia não
muda o contorno, e muito menos, o padrão facial. Pacientes braquicefálicos, com
a musculatura mastigatória (masseter) proeminente são os que se frustram com maior
frequência, sobretudo aqueles com tecido adiposo subcutâneo mais abundante.
Assim, para cumprir o papel de atender à queixa do
paciente, é preciso compreender as estruturas faciais que contribuem para as
bochechas volumosas, bem como oferecer o tratamento ideal para cada caso. E nos
casos em que o tratamento estiver fora do alcance técnico, indicar o paciente a
um profissional que possa executar o procedimento adequado (osteoplastias,
mioplastias, lipoaspiração e tratamentos não cirúrgicos).
(Dr. Fábio Calandrini é Cirurgião-Dentista e Médico,
especialista em Cirurgia Buco-Maxilo-Facial, pós-graduado em Cirurgia Plástica
da Face).